Dona Lucília preparou a alma do pequeno Plinio para compreender a sublimidade da devoção a Maria Santíssima. |
de uma autêntica mãe católica
Ser a quintessência da
família, do afeto, da diligência, da bondade, da misericórdia, numa palavra, da
incansável solicitude: tal é, no lar, o fundamental papel de uma autêntica mãe
católica.
Com efeito, para ser
inteiramente fiel a seus deveres maternos, importa que a mãe se mostre exímia
na educação de seus filhos, nos cuidados com o bem-estar deles e no atendimento
às diversas necessidades domésticas. Nisto se assemelha ela à mulher forte
exaltada nas Sagradas Escrituras. Mais ainda. Identifica-se com o celeste
arquétipo de todas as mães, Maria Santíssima.
Se Maria é sublime modelo
de mãe de família, não será verdade que a boa mãe deve ser para seus filhos uma
representação viva da Mãe de Jesus?
Contando-nos suas mais
remotas recordações de infância, revela-nos Dr. Plinio nas linhas seguintes
como Dona Lucília, requintando-se em seus maternais desvelos, preparou
suavemente a alma dele para compreender a excelsitude da devoção a Nossa
Senhora. Sobretudo, para amá-La com todas as fibras de seu coração.
A mais antiga recordação
que guardo de mamãe data do tempo em que eu tinha uns três anos. Lembro-me de
vê-la dormindo ao lado de papai, e eu, no meio da noite, tentando passar para a
cama deles, junto à qual estava colocado meu berço de criança.
Nesse período de minha infância era eu muito sujeito a insônias, acordando com frequência durante a noite. E como acontece com toda criança nessas circunstâncias, sentia-me perdido na escuridão, no negrume, na incógnita das horas que não passam, da noite que não acaba, meio ameaçadora e misteriosa. A isso se acrescentava o vago mal-estar que sempre acompanha uma insônia. Aflito, eu me punha de pé e me apoiava na balaustrada do berço, que era o terraço do qual eu considerava o mundo. A penumbra continuava a me envolver, e os minutos se escoavam lentamente . . .
Nesse período de minha infância era eu muito sujeito a insônias, acordando com frequência durante a noite. E como acontece com toda criança nessas circunstâncias, sentia-me perdido na escuridão, no negrume, na incógnita das horas que não passam, da noite que não acaba, meio ameaçadora e misteriosa. A isso se acrescentava o vago mal-estar que sempre acompanha uma insônia. Aflito, eu me punha de pé e me apoiava na balaustrada do berço, que era o terraço do qual eu considerava o mundo. A penumbra continuava a me envolver, e os minutos se escoavam lentamente . . .
Havia, porém, outro fator
que me tornava ainda mais penosos aqueles momentos de insônia. Segundo o
costume daquele tempo, as portas da casa de minha avó materna, onde então
morávamos, tinham na parte superior uma bandeira de vidro. O que me permitia
ver o lustre do corredor contíguo, cuja lâmpada elétrica permanecia acesa a
noite inteira.
Durante certo período de sua infância, Plinio era sujeito a insônias, e como acontece com toda criança sentia-se perdido na escuridão. |
Por serem ainda muito
moços, o sono deles corria caudaloso, abundante, e eu percebia que,
despertando-os, iria interromper uma coisa deleitável, pois eles estavam
dormindo com muito bem-estar. Donde o meu receio: “Se eu os acordar, dará
encrenca. Da outra vez não deu, mas desta dá, e vai piorar a situação. Eles
voltarão a dormir, e eu ficarei aqui, sozinho, com um pito em cima da cabeça.
Quando é que vem esta manhã, que nunca mais chega?"
Eram ideias que,
distintamente, acudiam-me ao espírito. Eu fixava perplexo, perdido . . .
Entretanto, sempre pronta
a me socorrer em minhas dificuldades, Dona Lucília costumava deixar abaixada a
grade de meu berço, do lado que encostava na cama dela, dando-me a entender
assim que eu podia fazer o que quisesse, porque mãe é mãe.
Afinal, depois de tantos
temores e angústias, transpunha eu o passo para o qual me solicitava aquela
grade previamente abaixada, e tocava em mamãe. Dona Lucilia continuava
dormindo. Meu pensamento: “Ela não acorda, mas estou precisando dela mais do
que nunca . . .”
Em certo momento, numa
manifestação primeva de minha futura truculência, eu decidia: “Bom, vou
acordá-la de qualquer jeito!”
Recordo-me que eu, de pé,
mal conseguia chegar com meus braços ao nível do colchão dela, mas agarra-me
aos lençóis e subia. Sentava-me, literalmente, sobre o peito dela, e abria-lhe
os olhos com os dedinhos. Contudo, até mamãe acordar, pairava uma interrogação:
“O que vai acontecer quando ela despertar?”
"Eu me sentia inundado de bem-estar, consolado, e encantado com ela." |
Finalmente mamãe abre os
olhos. “Chegou a hora (pensava eu, receoso). Ou acorda diante de mim um sol de
penas, de condescendência e de piedade, ou é um dragão resfolegando indignação:
Que é isso?! Sua mãe tem tanta coisa para fazer e você a está amolando a esta hora?”
Eu sentia a minha
fraqueza: “Tem mesmo tanta coisa para fazer. Eu sou uma coisa que ela tem para
fazer. Eu, acordá-la? Mas, não aguento ficar sozinho . . .”
Porém, de todas as vezes,
sem exceção, sentava-se ela imediatamente na cama, pegava o seu travesseiro,
sentava-me em cima dele e me tranquilizava:
- Filhinho, o que há?
Em seguida, tomava-me pelo
tronco, segurando embaixo dos braços. Brincava comigo, abraçava-me e me
beijava. Mais do que o sentido do que ela dizia, impressionava-me profundamente
a comunicação do seu afeto inefável. Eu me sentia inundado de bem-estar,
consolado, e encantado com ela.
Sobre o calor do afeto materno de sua mãe, Plinio concluía: "Como ela ninguém. Basta eu ser bom, que ela será para comigo um mar de bondade" |
Por vezes, meu pai deixava
escapar algum resmungo muito pacífico, voltava-se para o outro lado e
continuava a dormir sossegadamente. Eu pensava: “Ele não é ela. E se ela fosse
como ele, eu me desagregava. Porém, como não é, eu tenho em quem confiar”. De
fato, o próprio tom de voz de mamãe me dava a certeza de poder chamá-la sempre,
que ela não desmentiria minhas esperanças. Afinal, quando Dona
Lucilia percebia que eu estava em condições de dormir, punha-me de volta no meu
berço. Creio, porém que ela permanecia ainda algum tempo acordada, a fim de ver
se o filho retomava o sono, pois nunca me aconteceu de acordar de novo e dar
com ela dormindo.
Imergindo eu outra vez no
reino dos sonhos, a noite terminava com um primeiro e mais antigo lance de
minha biografia.
Essas pequenas e
passageiras tragédias noturnas, nas quais entretanto experimentava eu a incansável
solicitude de mamãe, levavam-me quase instintivamente a comparar Dona Lucilia
com outras pessoas mais velhas da casa. E eu chegava à seguinte conclusão: “Como
ela, ninguém. Basta eu ser bom, que ela será para comigo um mar de bondade.
Mas, se eu não o for, ela será minha adversária irredutível”.
Todas essas manifestações
de carinho de mamãe em relação a mim, todo esse contato com esse infatigável
desvelo, preparava-me e me predispunha para algo de muitíssimo mais elevado,
isto é, a devoção a Nossa Senhora.
A boa mãe nunca acha tedioso ou monótono estar com o filho. Tê-lo nos braços constitui uma de suas maiores alegrias. Nossa Senhora da Confiança |
Dessa maneira, a alma da criança, em contato com a mãe digna desse nome, começa a compreender o que é a bondade que não se cansa, a graça, o favor, o amor que não se exaure, aquela forma de afeto materno que nunca acha tedioso ou monótono estar com o filho. Tê-lo nos braços, brincar com ele, ser importunada durante o dia com perguntinhas, etc., constitui a alegria da vida para a boa mãe.
E assim compreendemos
também, e melhor, o papel de Nossa Senhora em relação aos homens. Pois alguém
que, no limiar de sua existência, seja assistido por uma boa mãe, poderá levar
uma vida difícil, mas a recordação da figura materna, evocando os aspectos
paradisíacos e inocentes de sua infância, alimentará nele a esperança do
Paraíso Celeste, onde nos espera a boa Mãe por excelência, a Mãe das mães,
Maria Santíssima.
(Revista Dr. Plinio, No. 02 - Maio de 1998)
(Revista Dr. Plinio, No. 02 - Maio de 1998)
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