As semelhanças históricas entre José do Egito e São
José
Infelizmente, o plano primitivo de Deus com relação
ao Egito não se cumpriu, dada a constante infidelidade de ambos os povos –
israelita e egípcio – como foi comentado no último artigo sobre este tema.[1]
Já a providencial ida de José, filho de Jacó, ao Egito
havia sido uma tentativa de reativar esse projeto divino, objetivo em parte
atingido com a grande influência adquirida pelo patriarca na corte do faraó, o
que sem dúvida propiciou um influxo positivo sobre toda a sociedade
egípcia.[2] Os acontecimentos posteriores, porém, derrubaram por terra o
que teria sido uma interessante cooperação entre as duas nações, muito antes da
vinda do Redentor.
Nessa perspectiva, o exílio da Sagrada Família no Egito apresenta-se, da parte de Deus, “como quem chama um povo dileto adormecido. Dir-se-ia que Nosso Senhor tinha pressa de ir ao Egito”.[3]
Nessa perspectiva, o exílio da Sagrada Família no Egito apresenta-se, da parte de Deus, “como quem chama um povo dileto adormecido. Dir-se-ia que Nosso Senhor tinha pressa de ir ao Egito”.[3]
A partir dessas considerações, não é descabido
encontrar uma ligação com José do Egito na imprevista viagem comandada por um
varão de mesmo nome. O plano de Deus com essa fuga consistia em fazer com o
Menino Jesus o mesmo que se dera com o filho de Jacó. Ali chegando, os egípcios
não demorariam em relacionar esse judeu chamado José com o hebreu que, séculos
antes, marcara a história de seu povo.[4] Se os descendentes dos súditos do
faraó correspondessem à graça, São José e Nossa Senhora ganhariam a simpatia de
todos, alcançando, mais uma vez, a cúpula do reino.
A princípio São José receberia encargos do próprio
monarca, mas, quando Nosso Senhor crescesse, demonstraria tal sabedoria e
tantos talentos extraordinários, que o governante e sua corte se converteriam
ao judaísmo e se deixariam influenciar totalmente por Ele. O Egito tornar-se-ia
um estado ainda mais cheio de esplendor temporal, acrescido das bênçãos
decorrentes da presença da Sagrada Família. Com isso estaria criada a
plataforma para o futuro apostolado do Divino Mestre durante a vida pública:
sua fama chegaria a Israel, que emulava os progressos da nação egípcia, e
quando Ele Se apresentasse ao povo eleito teria uma penetração muito maior.
Desse modo, a expansão da primitiva Igreja dar-se-ia mais através do Egito,
devido ao charme deste povo, que por meio de Roma, inicialmente chamada a um
eficaz papel organizativo.
[1] MONS. JOÃO, Clá Dias. São José; quem o
conhece? Ipsis, São Paulo, 2017. Pg. 285-289.
[2] Sendo os hebreus o único povo monoteísta
da Antiguidade, sua influência no Egito talvez tenha apresentado como melhor
fruto o aparecimento, no ano de 1364 a.C., de Amenhotep IV, mais conhecido como
Akhenaton, um faraó monoteísta. Destoava ele das ideias de sua época e abalou o
império faraônico até os alicerces, promovendo uma profunda revolução técnica,
artística e, sobretudo, religiosa. Contudo, com a morte de Akhenaton, depois de
dezessete anos de reinado, essa fase tão controvertida da história
egípcia chegou ao fim e seu povo voltou ao
politeísmo, restabelecido por seus sucessores, principalmente pelo famoso
Tutankhamon. Não obstante, “o reinado de Akhenaton, além de surpreendente,
levanta diversas interrogações. Ele coincide com o período durante o qual se
supõe que grande número de hebreus vivia nesse país. E, embora seguindo a
opinião de estudiosos como Giacomo Perego, segundo o qual ‘qualquer
reconstrução histórica desse período deve ser vista com muita cautela’, podemos
levantar hipóteses com base nos indícios disponíveis, conforme é praxe em toda
atividade científica”
(SAINT’AMANT, EP, Alejandro Javier de. Akhenaton: o
faraó inovador. In: Arautos do Evangelho. São Paulo. Ano X. N.115 [Jul., 2011];
p.37).
[3] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Palestra. São
Paulo, 5 fev. 1981.
[4] São Bernardo mostra essa relação com a
beleza que caracteriza sua pena: “Recorda também aquele grande patriarca,
vendido no Egito, que não só se chamou como ele, como também se comparou em sua
castidade, igualando-se por sua inocência e por seus dons. José, vendido por
inveja de seus irmãos e levado ao Egito, prefigurou a venda de Cristo. Este
outro José, fugindo da inveja de Herodes, levou Cristo até o Egito. José, para
não trair a seu amo, resistiu ao pecado com a mulher de seu senhor. Este José
reconheceu sua Senhora como Virgem e Mãe de seu Senhor. E mediante sua
continência, custodiou-A em tudo fielmente. Ao patriarca foi concedido o dom de
ler nos mistérios dos sonhos; em José foi infundida a graça de conhecer e
participar ativamente nos mistérios divinos. Aquele armazenou o trigo, não para
si mesmo, mas para todo o povo; este recebeu o Pão do Céu e o guardou para si e
para todo o mundo”. (SÃO BERNARDO. In laudibus Virginis Matris. Hom.II, n.16.
In: Obras Completas. 2.ed. Madrid: BAC, 1994, v.II, p.635.) Também Gerson faz o
mesmo paralelo (cf. GERSON, Jean. Josephina. Paris: Enault et Mas, 1874,
p.216).
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